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Dia Mundial do Coração: Luís esteve 10 dias sem saber que estava a ter um enfarte

29 Set 2023 - 09:59

Dia Mundial do Coração: Luís esteve 10 dias sem saber que estava a ter um enfarte

Luís Coutinho praticou atletismo durante 30 anos. Fez 14 maratonas e centenas de meias-maratonas. A dias de fazer 57 anos, teve um enfarte agudo do miocárdio e foi obrigado a abrandar. Três anos depois, continua com o “vício” de correr, mas sem o nível de competição a que habituou o corpo e com um “amigo para o resto da vida”: um comprimido.

Mas o que é um enfarte agudo do miocárdio? Quais são os grupos de risco? E como se vive depois de um enfarte? É a partir da história de Luís Coutinho e dos esclarecimentos do assessor médico da Fundação Portuguesa de Cardiologia Luís Negrão que o Viral tenta esclarecer estas questões.

Foram 10 dias “a brincar” sem saber que estava a ter um enfarte

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7 de junho de 2020. Fim de semana. Luís Coutinho estava a pintar muros em casa quando sentiu um mal-estar. “Foi uma coisa rápida, uns 10 ou 15 segundos e passou”, conta ao Viral. Mais tarde, voltou a sentir o desconforto e, por volta da meia noite, de novo. Depois de ir à rua “apanhar ar”, o incómodo passou.

Na quarta-feira, voltou a sentir-se mal. Mas foi na sexta que se assustou. Foram cerca de 20 minutos com o tal mal-estar. Mas a sensação, que não sabe bem definir, acabava sempre por passar.

Domingo treinou, como habitualmente fazia, conduziu um camião de Elvas a Lisboa, e começou a sentir sono. Carregou frutas e legumes e, quando voltou a casa, já “não estava bem em lado nenhum”.

“Engatar o camião já foi difícil. O desconforto que sentia era como se o coração estivesse a empurrar alguma coisa”, relata.

Na segunda-feira, foi visto pelo médico de família, que “percebeu logo o que se passava” e encaminhou Luís para o hospital. Nesse dia, ficou no de Elvas. No dia seguinte, foi transferido para o de Évora.

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Os sintomas já eram diferentes. O mal-estar já era em espaços curtos. Foram 10 dias “a brincar”, sem saber que estava a ter um enfarte.

Afinal, Luís Coutinho, guarda prisional de profissão e atleta nos tempos livres, fez 14 maratonas e centenas de meias maratonas. Nunca fumou nem bebeu exageradamente. Por ter feito desporto “toda a vida”, nunca pensou que estivesse a ter um enfarte.

No Hospital de Évora fizeram-lhe um cateterismo e colocaram-lhe um ‘stent’, um dispositivo médico em forma de tubo que serve para desobstruir vasos sanguíneos. Esteve seis meses a fazer apenas caminhadas e, ao fim desse tempo e após provas de esforço, voltou a ter a “vida normal” e a treinar aos poucos.

“Tenho um comprimido para o sangue não engrossar, que tenho de tomar para o resto da vida. É uma precaução. Tomo todos os dias depois do pequeno-almoço”, conta. 

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Três anos depois, agora com 60 anos, não se sente cansado. A competição, que era o que mais gostava, ficou para trás.

“Podia estar a chover, frio, neve, muito calor, eu tinha de ir. Quando chegamos a um patamar, há um trabalho durante a semana. Cheguei a treinar às quatro ou cinco da manhã, antes de ir para o trabalho. Tinha de ter aquela hora e meia para mim”, relata.

Mas o atletismo continua presente na sua vida. Continua a treinar todos os dias, “com mais calma, menos ritmo” e até descobriu o gosto por andar de bicicleta.

“Além do meu trabalho, tenho de fazer qualquer coisa. Posso ter muito que fazer em casa, trabalhar bastante, mas aquelas horas por dia ninguém me tira. Está no meu ADN”, remata. 

O que é um enfarte agudo do miocárdio? 

Luís Negrão, médico de saúde pública e assessor médico da Fundação Portuguesa de Cardiologia, descreve um enfarte agudo do miocárdio como um momento “angustiante”.

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“A sensação que se tem é aquela que temos quando nos cortam a circulação na Segunda Circular porque houve um autocarro que se despistou e bloqueou a estrada. É angustiante. As pessoas têm de chegar ao emprego, porque têm imenso trabalho e não conseguem porque algo foi interrompido”, retrata.

Um enfarte provoca um “desconforto grande, uma sensação de aperto, mal-estar e suores frios”, explica o médico de saúde pública.

Enquanto nos homens a dor é mais agressiva e intensa, nas mulheres este evento agudo acaba por ser “ligeiramente diferente”. Isto é, “menos visível e pouco definido”.

Habitualmente, as mulheres sentem uma “impressão, estão mais cansadas, não ligam, porque acham que é o cansaço normal”. No entanto, quando as proporções começam a ser maiores, preocupam-se e aí “pode ser tarde demais”.

Apesar de ser apenas do “tamanho de um grande punho”, o coração humano é o músculo que mais trabalha. Bombeia sangue, que transporta oxigénio e nutrientes, para todo o corpo. Bate cerca de 100 mil vezes e bombeia até 7.500 litros de sangue todos os dias, informa a World Heart Federation (WHF), Federação Mundial do Coração em português.

“O músculo cardíaco depende das artérias coronárias que lhe fornecem o sangue. Se, de repente, interrompermos a circulação sanguínea, o músculo cardíaco vê-se sem os nutrientes e oxigénio. Toda a área abrangida pela artéria coronária tem uma isquemia. Um enfarte é a morte dessa massa muscular, resultante da obstrução da artéria”, explica Luís Negrão.

As doenças cardiovasculares – como o enfarte, o Acidente Vascular Cerebral (AVS) ou insuficiência cardíaca – são a causa da morte de cerca de 20,5 milhões de pessoas todos os anos, refere um folheto informativo da Fundação Portuguesa de Cardiologia, que as descreve como “as maiores assassinas do mundo”.

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Quais são as consequências de um enfarte?

A morte súbita é uma das consequências de um enfarte agudo do miocárdio. Mas é possível sobreviver. Quanto mais rápido for o socorro, menores poderão ser as consequências.

Durante um enfarte, é fundamental a “rápida desobstrução” para os nutrientes poderem voltar ao coração, acrescenta o médico de saúde pública consultado pelo Viral.

A qualidade de vida fica “sempre afetada”. No entanto, o nível de impacto vai depender se o enfarte foi localizado ou se teve uma extensão maior. O doente vai ter insuficiência cardíaca se a extensão for maior.

Em caso de insuficiência cardíaca, ao “subir um lance de escadas, ao pentear-se ou ao arranjar-se”, vai sentir-se “mais cansado que a Rosa Mota quando acabou a maratona”, descreve o especialista.

As consequências envolvem “toda a família”, uma vez que há “muitas dúvidas” após a alta hospitalar. Vão ter de alterar o “padrão alimentar, o modo de vida, ter novos comportamentos”, exemplifica Luís Negrão.

Após um enfarte, se for fumador, “esqueça o tabaco”, aconselha o mesmo médico ouvido pelo Viral.

Além de ter de “vigiar o colesterol e a tensão“, as recomendações são para que pratique atividade física “moderada”, ou seja, no mínimo, durante trinta minutos, cinco dias por semana.

“Preocupe-se com o peso e com a alimentação. Seja o mais ativo possível: vá passear o cão, faça a cama, arrume a casa, cuide do jardim, ande de bicicleta, caminhe o mais possível e em circuitos planos”, aconselha.

Quais são as principais causas de um enfarte? E os grupos de risco?

Questionado sobre as principais causas de um enfarte, o especialista em saúde pública destaca “dois fatores invisíveis”: o colesterol elevado e a tensão arterial elevada.

“São dois fatores invisíveis porque as pessoas não têm consciência que os têm. Não apresentam sinais ou sintomas de alerta. Por isso, a Fundação Portuguesa de Cardiologia costuma vir para a rua fazer rastreios”, afirma.

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Ser fumador é também uma das principais causas, assim como o “histórico familiar”, indica. O médico alerta ainda para a diabetes e para a obesidade. A doença renal e o stress são ainda fatores apontados pela World Heart Federation.

Por outro lado, refere Luís Negrão, a idade também influencia: “Quanto mais velhos somos, maior é a probabilidade de termos um enfarte agudo do miocárdio”.

No fundo, a probabilidade de ter um enfarte é maior “quanto maiores forem os fatores de risco e quanto mais comportamentos de risco tiver”.

O Dia Mundial do Coração, que se assinala a 29 de setembro, foi criado pela World Heart Federation para alertar para a importância de “cuidar do coração”. O dia é celebrado pelos mais de 200 grupos de especialistas, pacientes e organizações que pertencem à WHF ao partilharem informação e conhecimento sobre a saúde cardiovascular.

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Cardiologia

29 Set 2023 - 09:59

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